Justiça decide que artista plástica poderá produzir, vender e divulgar esculturas de santos pop



Até então, autora só podia fazer e comercializar as peças em lojas físicas. Advogado diz que situação era 'esdrúxula', pois maior volume de negócios era pela internet.


Justiça de Goiás autorizou a artista Ana Paula Dornelas Guimarães de Lima, conhecida como Ana Smile, a anunciar e vender na web as esculturas de santos que produz, inspiradas na cultura pop, como Galinha Pintadinha e Superman. Ela já estava autorizada a fabricar e comercializar as peças em lojas físicas, mas como ainda permanecia o veto à publicação nas redes sociais, onde realiza o maior volume de vendas, a defesa recorreu. Cabe recurso da decisão por parte da Arquidiocese de Goiânia, autora da ação.







Em nota, a Arquidiocese de Goiânia informou que não vai se pronunciar sobre o assunto.

A decisão, do desembargador Norival Santomé, da 6ª Câmara Cível, é a terceira relacionada ao caso. A primeira ocorreu em junho de 2016, quando o juiz Abílio Wolney Aires Neto, da 9ª Vara Cível de Goiânia, proibiu a produção, venda e divulgação das peças.


Na ocasião, ele destacou que havia "conflito" entre os direitos e garantias fundamentais e estipulou multa de R$ 50 mil em caso de descumprimento.

Meses depois, o juiz Wilson Safatle Faiad reformou a decisão. Ele autorizou que Ana fizesse e comercializasse as estátuas, mas proibiu a veiculação de imagens das mesmas nas redes sociais.

O advogado de Ana, Alexandre Alencastro Veiga, disse que, apesar da liberação para produção e venda, a artista praticamente não trabalhou na confecção das peças.

"Era uma situação esdrúxula. Ela só podia vender em lojas físicas e nem postar uma foto nas redes sociais, onde ela vendia quase que integralmente seu produto. Por isso, ela produziu em uma pequena escala porque a venda no comércio era praticamente insignificante".


Justificativa



Em seu despacho, Santomé destacou que a divulgação das peças pela artista "não possuem o condão de, por si só, ferir a imagem ou honra da Igreja Católica”.

Além disso, o magistrado advertiu que a situação impedia Ana de desenvolver seu trabalho, o qual era responsável pelo seu sustento, "sem o qual não há dignidade" e que, sem ser realizado, poderia ocasionar "danos de difícil ou impossível reparação".

Por fim, o juiz explica: "a decisão digladiada, da forma como proferida, tem potencial de cerceamento à liberdade de expressão e manifesto do pensamento, estes tão caros ao vigente sistema constitucional".

Polêmica




Após a primeira decisão, a Justiça chegou a recolher algumas imagens na casa da artista. De acordo com o Ministério Público, na casa de Ana Smile foram encontradas quatro estátuas de gesso de São Judas, três de São Benedito, além de uma de um frei, de um padre e uma de Nossa Senhora de Guadalupe.

Na época em que a Arquidiocese entrou com ação, afirmou em nota que "a autora extrapolou, deliberadamente, o seu direito constitucional de livre manifestação de pensamento, ferindo o também direito constitucional da Igreja Católica, de inviolabilidade de consciência e crença".


Em resposta, Smile disse que não entendia o motivo da decisão. Ela salientou que o intuito ao fazer as esculturas não era atingir qualquer religião e que as peças são apenas fruto "de um trabalho ligado à arte pop".

"Nunca quis agredir a fé de ninguém. É uma coisa para quem gosta de algo diferente. Sou de família católica e todos me apoiam, gostam do que eu faço e têm exemplares em casa. Minha avó, inclusive, que não sai da igreja, não viu problema",  na ocasião.






Ana disse ainda que teve a ideia de produzir as peças depois que viu um meme na internet e se apaixonou pela ideia. Na foto, Batman carregava Robin no colo ao estilo das imagens sacras.

"Achei aquilo sensacional, me encantou. Revirei a internet e não encontrei uma para comprar. Então resolvi fazer eu mesma. Fui a uma fábrica de gesso, pintei e postei. Vários amigos e conhecidos começaram a me pedir", lembra.

A situação também ganhou repercussão depois que uma imagem da artista - uma Nossa Senhora pintada de amarelo, com chifres e machas negras, similares as de uma vaca, foi usada no material de divulgação do Festival Vaca Amarela, organizado em Goiânia e considerado um dos maiores de música alternativa do país. A situação dividiu os internautas.